quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

O Facebook vale o preço que a gente se vende

Quer dizer então que o Facebook vai anunciar no ano que vem que vale US$ 100 bilhões? Não faço ideia do que sejam US$ 100 bilhões, e aposto que nem o povo do Facebook faça, incluindo aí o sabido do Mark Zuckerberg. Até porque, vamos combinar, 100 bi-lhões de dó-la-res simplesmente não existem. Ou melhor, existem sim. No plano do dinheiro inventado - plano infalível este que está desmoronando em efeito dominó economias no mundo inteiro -, 100 bi-lhões de dó-la-res são ironicamente tão reais quanto aquilo que o próprio Facebook promove: uma experiência social filtrada, mineral e saciável.

Cada vez mais, cientes ou não de que estamos à mercê de uma ferramenta online disposta a tudo para vender nossos dados, gostos, amores e divórcios para quem estiver interessado em pagar por isso, usamos o Facebook para mediar o que entendemos por realidade. E não importa se você só entra lá para "observar os outros" - o usuário voyeur - ou para "compartilhar links" - o usuário "só bebo socialmente".

Fato é que o Facebook nunca foi exatamente o "livro dos rostos" ou mesmo uma representação mais complexa do tal livro da faculdade, como surgiu a ideia inicialmente. Ele é, para qualquer tipo de usuário, um meio de minimizar o ruim e maximizar o bom, é aquele desequilíbrio necessário. O jeito mais fácil e rápido de você trancar em um espaço fechado a ideia que você faz de si mesmo e dos outros. Não sei se isso não é moralmente questionável, mas sei que é comercialmente genial.

Afinal de contas, tem jeito melhor de vender para pessoas que podem, com alguns poucos cliques, ser encerradas segundos seus interesses e links compartilhados? O Facebook, que bem poderia ser chamado de Fakebook ("fake" de falso) dada a quantidade de projeções que colocamos e/ou vemos ali, é o jeito mais simples de transformar sujeitos em objetos. Até porque quem está nas prateleiras agora somos nós, catalogados e etiquetados de acordo com nossas fotos, links, comentários e "likes". E somos vendidos diariamente.

Me lembra o depoimento (fictício) de uma personagem do filme canadense Os Amores Imaginários, quando a moça fala que assim que ele se mudou pro apartamento dela, a relação acabou. Acabou porque a ideia de amor que ela criou era um "ser" a parte. "Eu era apaixonada pela ideia do nosso amor, é o conceito que você ama." Uma vez que acabou a distância, no caso dela, acabou a ideia do amor como esse envelope fechado e perfumado. O Facebook, muito sabiamente, nos usa de conceito e nos envia em envelopes para um sem números de empresas que querem nos achar. E parecemos amar cada vez mais essa ideia e alimentar essa distância. Sendo assim, o Facebook vale o dinheiro que não existe porque nós valemos o que não somos. Ou melhor, nessa lógica, ele vale muito mais que US$ 100 bilhões. Vale o queremos ser e como queremos nos vender.

O que também me faz recordar outro trecho da ficção, desta vez literária. Nesse nosso processo gradual de objetificação, nos assemelhamos aos personagens de um conto de José Saramago chamado Coisas. Nele, as tais coisas que nos cercam, das portas que abrimos às roupas que vestimos, começam a se descontentar com seu papel de objetos e passam a assumir o controle da situação. A única solução é "resetar" (palavra que, claro, Saramago não usa) o sistema e ficar completamente nu, despido de todas essas¿ coisas. "Agora é preciso reconstruir tudo. Não tínhamos outro remédio, quando as coisas éramos nós. Não voltarão os homens a ser postos no lugar das coisas", diz a personagem. Saramago podia ser um descrente, mas não se pode negar que ele era um otimista nato.

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